terça-feira, 29 de abril de 2014

APÓS UM ANO, O QUE RESULTOU DA OPERAÇÃO CONCUTARE?

Carta Aberta ao Governo do Estado, à Prefeitura de Porto Alegre e ao Ministério Público Federal

Há um ano, no dia 29 de abril de 2013, a Polícia Federal deflagrou a Operação Concutare cujo objetivo era reprimir crimes ambientais contra a administração pública e lavagem de dinheiro que envolviam licenças ambientais no Rio Grande do Sul e em Porto Alegre. Foram presas 18 pessoas, entre elas o Secretário do Estado, Carlos Fernando Niedersberg, o Secretário Municipal de Meio Ambiente, Luiz Fernando Záchia, além do ex-Secretário Estadual de Meio Ambiente e empresário da área de consultoria ambiental, Berfran Rosado. Mais de 40 pessoas teriam sido indiciadas. O inquérito corre sob sigilo na área criminal do Ministério Público Federal, no Rio Grande do Sul.

As informações, então anunciadas pelos delegados da PF, tratavam de licenças ambientais fraudulentas, utilizadas principalmente na construção de obras ilegais de condomínios na zona sul de Porto Alegre e no Litoral Norte, além de irregularidades na extração de areia por parte de mineradoras no rio Jacuí. Lamentavelmente, há muito anos sabe-se que tais situações tornaram-se rotina no âmbito municipal e estadual, fruto da crônica desimportância dada ao setor ambiental por parte dos chefes de governo.

Com o ocorrido, o Movimento Gaúcho em Defesa do Meio Ambiente (Mogdema) e a Assembleia Permanente de Entidades em Defesa do Meio Ambiente (Apedema) protestaram em relação à situação que levou a isso e cobraram um conjunto de ações por parte dos respectivos governos [1].

terça-feira, 18 de março de 2014

Universidade, entre agroecologia e agronegócio

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Qual deveria ser o papel do ensino superior de Agricultura, num mundo que enfrenta fome e crise socioambiental planetária?
Por Luciana Jacob | Fotografia: Jorge Luiz Campos
Como instituição social que é, a universidade expressa a estrutura e o modo de funcionamento da sociedade, em suas atividades de ensino, pesquisa e extensão e em sua gestão. Assim, tal qual a sociedade, a universidade é constituída não só por diferentes visões de mundo, como principalmente por visões conflitantes: a produção de conhecimento e sua incorporação nos currículos universitários são processos atravessados por relações de poder.
A articulação dos conhecimentos existentes com o sistema econômico vigente orienta a formação de profissionais para as demandas explícitas do mercado. Isto fica evidente nas formas curriculares, na escolha de quais conhecimentos devem fazer parte da formação e tornar-se objetos de pesquisa e, principalmente, nas ausências que denunciam o descaso legado a projetos contra-hegemônicos. As atividades universitárias foram atingidas por forças que amplificaram sua condição de dependência à globalização neoliberal, afastando-se das demandas sociais necessárias para um projeto democrático de país. Elas têm se aproximado do mundo empresarial, relegando a segundo plano o interesse público.
Social e historicamente construídos, os saberes produzidos pela universidade são eleitos por determinados grupos sociais como legítimos, credíveis e merecedores de serem reproduzidos a determinados grupos sociais.
Que saberes e grupos sociais são incluídos e quais são excluídos da universidade e, em decorrência, quais divisões sociais são produzidas e reforçadas? Qual o significado da ausência de determinados saberes na universidade? É um silêncio genuíno ou fruto de um silenciamento, ou seja, de uma imposição epistemológica?
A degradação ambiental, o risco de colapso ecológico e o avanço da desigualdade e da pobreza são sinais muito graves da crise do mundo globalizado. Na agricultura, assistimos à perda da soberania alimentar, à fome, à violência no campo, à perda de diversidade genética e dos solos, ao avanço da concentração de terras, ao desmatamento, ao envenenamento por agrotóxicos. Paralelamente, temos assistido a uma ofensiva aterradora de setores conservadores do Congresso Nacional sobre os direitos fundamentais de indígenas, contra o Código Florestal e a Lei de Biossegurança. Presenciamos a aprovação indiscriminada de transgênicos, sem os estudos necessários e a devida responsabilidade social e científica.
De modo predominante, a universidade contribui para a manutenção do paradigma hegemônico, formando pessoas aptas a lhe dar continuidade e produzir conhecimento que alimenta e fortalece seus preceitos. Na área de Ciências Agrárias, as atividades acadêmicas geralmente se articulam em torno do paradigma do agronegócio como cânone de desenvolvimento do país. E, como sabemos, a razão que permeia o agronegócio tem como características o capitalismo e a globalização neoliberal; a total dependência de insumos finitos e externos ao sistema agrícola; a simplificação genética; a concentração de terras e riquezas; entre outros – aspectos completamente avessos à sustentabilidade socioambiental.
A organização das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD) divulgou recentemente o Relatório de 2013 sobre Comércio e Meio Ambiente, intitulado “Acorde antes que seja tarde demais: torne a agricultura verdadeiramente sustentável agora para a segurança alimentar em um clima em mudança” (em tradução livre do inglês). O relatório, para além de alertar sobre os danos do paradigma hegemônico de produção agrícola, aponta a adoção da agroecologia como fundamental para evitar o agravamento da crise socioambiental e prováveis crises alimentares futuras – exatamente o oposto do que vem sendo desenvolvido pela grande parte das universidades brasileiras.
A construção de uma racionalidade ambiental para o enfrentamento destes problemas – em oposição à racionalidade econômica – exige a elaboração de novos saberes e, principalmente, a participação dos grupos historicamente silenciados e que mais sofrem as consequências nefastas da crise da modernidade na construção destes saberes. No espaço da universidade, isto implica a internalização das discussões socioambientais nas atividades de ensino e pesquisa, a abertura do diálogo com outras formas de saber e o repensar do papel da extensão universitária na perspectiva que Boaventura de Sousa Santos chama de ecologia de saberes.
Assento esta ideia em três pressupostos. A abundância de conhecimento no mundo é muito superior ao o conhecimento disponível em um currículo de determinada área. Além disso, a escolha de quais conhecimentos são legítimos e válidos é feita pelos grupos sociais dominantes e que assim o são pois historicamente oprimiram os grupos sociais hoje excluídos. Por fim, esta relação de poder guarda em si a força da hierarquização: os saberes que não passam nesse crivo são considerados alternativos, lendas, crenças, locais, ou seja, são descredibilizados.
Como avançar na construção de conhecimento socioambiental destinado à transformação social, quando a cultura e os saberes de camponeses e camponesas foram marginalizados e deslegitimados? Como dissolver o muro que tem separado a universidade das lutas sociais de modo geral e, especificamente, da agroecologia e soberania alimentar?
Proponho três alternativas que, se não completas e definitivas, se configuram como desafios para estas transformações.
Primeiro: mudanças nas prioridades da universidade – o que, como e para quem pesquisar e ensinar – não se operam de forma desconectada das estruturas sociais. Embora possa ser espaço de resistência, questionamento e promoção de transformação social, a universidade é sobretudo reprodutora de paradigmas mais amplos e funciona de acordo com dinâmicas sociais que por vezes a transcendem. Assim, não há possibilidade de se construir conhecimento contra-hegemônico de forma descolada dos grupos que mais sofrem as violências do conhecimento hegemônico nem à revelia de outros setores da sociedade. Há a necessidade de se avançar para uma ecologia de saberes que, segundo Boaventura, é o confrontamento da monocultura do saber e do rigor científico pela identificação de outros saberes e de outros critérios de rigor que operam credivelmente em práticas sociais.
O segundo é que as mudanças não podem ser implementadas apenas por alguns, mas é pela força de alguns poucos que elas ganharão projeção institucional. Sua promoção faz sentido em contextos específicos, com lutas conectadas com a história de cada instituição, apesar de fortalecerem e serem fortalecidas por lutas mais amplas, de outros grupos sociais, de outros lugares, de outros movimentos, de outras escalas e outras identidades culturais – ou seja, inserida em uma globalização contra-hegemônica.
O terceiro é que não há possibilidade de se pensar a inclusão de saberes socioambientais na universidade sem que isto seja tratado em termos epistemológicos e metodológicos. Epistemológicos porque promover o debate sobre sustentabilidade na universidade requer uma ecologia de saberes que luta contra a injustiça cognitiva. E metodológicos, uma vez que a inserção deste saber, pela sua própria complexidade, está imbricado também no questionamento crítico acerca dos métodos e estruturas em que se pauta atualmente o ensino superior.

quinta-feira, 6 de fevereiro de 2014

Artigo: Reflexões por uma sociedade soberana


Compartilho aqui meu artigo publicado em dezembro de 2013 na Revista Habitus (IFCS/UFRJ), intitulado "Reflexões por uma sociedade soberana".

Aqui estão todos os artigos da edição (v.11, n.2, 2013):

Aqui meu artigo propriamente:

Do editorial:
Em “Reflexões por uma sociedade soberana”, Claudio Ricardo Martins dos Reis apresenta uma compreensiva análise crítica da sociedade - em diferentes níveis e áreas - e ponderações sobre os caminhos para mudança. O artigo parte de diversas correntes do pensamento libertário, socialista e ambientalista para propor um processo revolucionário sistêmico e interdisciplinar.

Resumo:
Este artigo apresenta duas teses principais. Uma diz respeito à proposta de um conceito integrado de sociedade soberana. A outra se refere à necessidade de conexão entre práticas emancipatórias de maiores e menores dimensões. A primeira decorre da análise da sociedade como um sistema que inclui os subsistemas econômico, político, ambiental e cultural. A segunda pressupõe a compreensão de que estes subsistemas estão estruturados em níveis distintos (locais, regionais e global). A partir dessas duas teses, propõe-se um processo revolucionário sistêmico e estruturado em níveis, para o qual cinco condições são apresentadas como necessárias.



quarta-feira, 18 de dezembro de 2013

Soja trangênica: problema político, não técnico

José Lutzenberger, para Gazeta Mercantil
19 de fevereiro de 1999

A genética moderna, ou seja, a biologia molecular,constitui-se em uma das grandes aventuras do espírito humano neste século, tais como a relatividade especial e a geral, a física nuclear e de partículas elementares, a deriva dos continentes. Infelizmente, neste campo, está ocorrendo uma grave perversão.

O jovem Einstein, quando elaborava suas geniais teorias, ganhava a vida como funcionário do departamento de patentes da Suíça, em Zurique. Jamais, no entanto, lhe teria ocorrido patentear suas idéias. O próprio James Watts e seu companheiro Francis Crick, que desvendaram a estrutura molecular do código genético, não tiveram a presunção de requerer patente para sua descoberta.

Bioma Pampa: um presente com que futuro?


Neste dia 17 de dezembro, Dia do Pampa, o Movimento Gaúcho em Defesa  do Meio Ambiente (MoGDeMA) e o Projeto de Extensão Construindo Consciência Crítica da UFRGS vêm a público alertar para o atual processo de degradação deste bioma único no Brasil.

O documento a seguir é resultado de um processo de cobrança de parte da sociedade para com os governos no que se refere à realização do seminário ocorrido no dia 10 de dezembro de 2013, no Auditório da Faculdade de Economia da UFRGS, no Painel Bioma Pampa, Presente e Futuro: o que temos a apresentar aos gaúchos?. O objetivo do encontro foi avaliar a situação atual do bioma e as perspectivas quanto às políticas públicas voltadas tanto ao Pampa como aos Campos Sulinos, no Rio Grande do Sul. Estiveram presentes nas apresentações do painel o Professor Dr. Valério de Patta Pillar (Departamento de Ecologia da UFRGS); o Biólogo, Dr. Luís Fernando Perelló, Secretário Adjunto da SEMA-RS, representando o Governo do Estado; e o Biólogo, MSc. João Soccal Seyffarth, pelo Ministério de Meio Ambiente.

domingo, 10 de novembro de 2013

Juntos para sempre: O mais antigo ato sexual de insetos registrado!

Parafraseando o título do artigo publicado no dia 06 de novembro deste ano por Li e colaboradores (Li et al. Forever Love: The Hitherto Earliest Record of Copulating Insects from the Middle Jurassic of China na PloS One deste mês), este é o mais antigo registro fóssil de cópula de insetos encontrado até hoje (Figura 01). A contribuição óbvia destes fósseis é justamente guiar o entendimento da evolução da reprodução sexual dos insetos, e evidenciar, por exemplo, a distinção dos sexos em espécies fósseis.


Figura 01 - A) Indivíduos fósseis em posição de cópula de hemípteros do Jurássico Médio da China. B) Interpretação artística dos fósseis. Retirado de Li et al. 2013.

domingo, 27 de outubro de 2013

Como ler um texto argumentativo

O artigo abaixo é de autoria do professor Jeff McLaughlin (Ph.D., University College of the Cariboo) e tem como título original “How to Read a Philosophy Paper”. A tradução do original em inglês foi feita pela professora Dra. Maria Clara Cescato (UFPB). Este artigo é o primeiro de uma série de três.
Veja também:
filosofia-simpsons

Noam Chomsky - Fabricação do Consenso (documentário)




"Noam Chomsky nasceu em Filadélfia em 1928 de família judia ucraniana. Desde cedo se aproximou das idéias libertárias de pensadores judeus como Martin Buber, Gershom Scholem e da tradição dos emigrantes anarco-sindicalistas. Professor do MIT (Massachusetts Institute of Technology), aos 30 anos já era internacionalmente famoso pelas suas pesquisas em lingüística e suas teorias revolucionárias sobre estrutura da linguagem: a gramática generativa.

Aquele que podia ter sido um pacato e famoso professor universitário, não compactuou, no entanto, com o poder. Tal como havia feito nos anos 30 - quase criança - manifestando sua solidariedade aos libertários espanhóis vítimas do fascismo de Franco, nos anos 60 foi um dos principais intelectuais presentes na oposição à guerra do Vietnã participando também das lutas dos direitos civis que abalaram o establishment norte- americano. Chomsky mostrou como um intelectual pode viver duas vidas: a dum cientista brilhante e a do engajamento nas causas sociais. A partir daí podemos encontrar ao lado da obra do famoso lingüista, as análises ácidas do analista independente capaz de escrever Os Novos Mandarins, Ano 501: A Conquista Continua ou As Ilusões Necessárias: O Controle do Pensamento nas Sociedades Democráticas. Uma obra que se estende por mais de cinqüenta livros traduzidos em todo o mundo...


segunda-feira, 21 de outubro de 2013

Parte do documentário de Stephen Fry sobre homofobia: conversa com Angélica Ivo e com Jair Bolsonaro (PP-RJ)

Nesses 12 minutos ele conversa com Angélica Ivo, mãe de Alexandre Ivo, que foi sequestrado, torturado e assassinado por ser homossexual; e conversa também com Jair Bolsonaro (PP-RJ), que Stephen diz ter sido "Um dos mais estranhos e sinistros encontros que já tive na vida".

http://www.youtube.com/watch?v=9TiqyO5JQZs#t=370

quinta-feira, 17 de outubro de 2013

Vendendo o Mandato

Texto de Althen Teixeira Filho, professor da UFPel e membro do MOGDEMA  

O deputado federal Eduardo da Fonte (PP/PE), presidente da Comissão de Minas e Energia do Congresso Nacional, encaminhou projeto de lei que "cria o Conselho de Empreendimentos Energéticos, destinado a analisar, avocar e decidir, em última e definitiva instância, o licenciamento dos empreendimentos do setor elétrico considerados estratégicos para o Brasil". O intento, além de roubar do IBAMA, IPHAN e da FUNAI tais responsabilidades ambientais, "poderá dispensar oitiva" dos mesmos neste assunto, deixando para o futuro (?) a criação de regras e funcionamento. Como aprovar algo se não se sabe como vai funcionar?