domingo, 24 de janeiro de 2010

O paradeiro dos blogueiros e Causos de Gravataí

Avancei o mês de janeiro me estendendo pra conhecer um pouco mais daquele país lá do norte, o tal do Brasil. Na companhia do Costa e do Márcio (que de tão dançarino merecia aparecer no Faustão), desbravei todo o território costeiro até chegar em Maceió, nas Alagoas, para o Encontro Nacional dos Estudantes de Geografia, ou ENEG. Com paradas no Espírito Santo, Bahia e Sergipe, a indiada a bordo do ônibus da Acorip Turismo (sugiro que leiam a graça da empresa de trás para a frente. Piroca era o sobrenome do motorista e dono da empresa) foi, de largo, proveitosa. Conhecemos gentes de várias querências: Rio Grande, Pelotas, Campinas (transviadônica, hein), Minas Gerais, etc. Todo mundo muito agradável, tornando a viagem flor de especial. Moças de fino trato para embelezar as paisagens rebuscadas do nordeste e xirus sempre dispostos a uma boa charla e um mate bem cevado. Até os paulistas se engaucharam. Entre "mates", "ches" e "bahs", no mínimo uns dois estrangeiros se identificaram com o Rio Grande e partilharam as alegrias conosco.

Acontece que a rapadura é doce, mas não é mole. Foi bom e durou pouco; dia 21 estávamos nós, os três estudantes de biologia infiltrados no encontro dos colegas da geografia, chegados em Porto Alegre. Acabados. Depois de quase chorar de cansaço, dormir esperando o almoço e deixar uma nesga de pele nas areias alagoanas, estamos de volta ao pago acolhedor que é o Rio Grande, prontos pra continuar a peleia.

Mas, mudando de ares, que me bateu um minuano na orelha de balançar até o osso...

Hoje, domingo, o amigo Lucas ligou-me dizendo que tinha uma proposta. A ideia era ir para Gravataí procurar umas cachoeiras que ele conheceu quando morou lá, há cerca de dez anos. Gravataí é uma cidade vizinha, com o nome oriundo do tupi, querendo dizer Rio dos Gravatás. Lá tem muito gravatá. Muito gravatá tem lá. É, muito gravatá. Gravatá, pra quem não sabe, é uma plantinha de folha espinhuda, que nasce em meio às pastagens rasteiras, na beira de estradas e tal. Tem inclusive um causo interessante sobre o nome e a alcunha da cidade, mas fica pra próxima. Então, fomos atrás das cachoeiras. Depois de um tempo andando em vão, molhando os pés numa sanga suja e passando uma sede de fazer cacto chorar, resolvemos dar as caras num local que tem ali por perto: um sítio de acampamento para jovens, pertencente a uma instituição chamada Palavra da Vida. Entramos, fomos muito bem recebidos por um rapazote, que nos mostrou o lugar, onde vimos cachoeiras, trilhas pelo mato, quadras de esportes, etc. Local muito bonito, não minto. Tudo num clima meio ecológico, com a intenção de fazer o pessoal entrar em contato com a natureza. A mim, curioso que sou, me surpreendeu um guia muito bem elaborado, com todos os répteis e anfíbios mais comuns da região.

Até aí, só maravilhas. Agora, a parte que me tapa de nojo. A Palavra da Vida propõe acampamentos de verão com atividades integradoras e doutrinadoras para os jovens. Muito bem. Eu não apeei meu cavalo aqui nesse espaço pra pregar ateísmo nem nada, pois pra mim pregar é coisa de carpinteiro, mas tá aí algo que me irrita. E tem mais: por trás da instituição, que se diz sem fins lucrativos, estão missionários americanos (leia: exploradores). Isso me faz lembrar o que acontece na Amazônia Legal, onde centenas de seitas e missionários franceses, alemães e sei-lá-de-ondes fazem território e compram, com apoio do povo local e pagando em moeda de fé, as riquezas naturais do país. É.

Não sou nenhum queimador de igrejas, mas não consigo entender umas coisinhas. O sítio da Palavra da Vida é muito bonito por si só. A proposta de entrar em contato com a natureza é muy bela. Mas tudo isso é uma estratégia doutrinadora. É como se faz com ratinhos em laboratório: se quer que ele faça tal coisa, dá um pedaço de queijo como reforço positivo. Isso tem nome, e se chama Método Behaviorista Skinneriano, se bem me recordo. Acontece que doutrinar, pra mim, é muito apelativo. Fazer a cabeça de alguém é uma coisa que eu evito, e me dá um ranso de pensar que tentam fazer isso comigo o tempo todo. Um acampamento com uma proposta ecológica eu considero excelente. Usar isso de subterfúgio (e agora falei bonito) pra talhar numa mente bruta uma ideia impregnada de interesses duvidáveis, não me serve.

Não é bom conviver com gente diferente? Não é bom conhecer lugares novos, andar no mato (há quem não goste... me espanto, mas respeito!), acampar e tudo mais? Essas coisas são boas por si só, sem necessidade de ver um objetivo maior nelas. Exemplifiquei aqui mesmo, no início da postagem. Me sinto até um bagual muy romântico e meio finório ao olhar pra uma baita de uma árvore (um guapuruvu, tomadito de flor em final de primavera) e ver a beleza dela. E só dela. Na verdade, só dela chega a ser ofensivo. Uma árvore tem uma história muito mais interessante pra contar do que eu ou tu. Imagina que ela vem se alimentando só da terra e ar. Que um dia, tudo o que era necessário pra ela começar a história de vida tava dentro de uma semente que cabe no teu dedo. Eu acho isso muito mais interessante do que sentar em baixo dela, usando como sombra e ler um trecho da bíblia, porque me disseram que é de bueno alvitre.

Tá, vou parando por aqui. Da próxima vez que forem pra um acampamento temático, seja ele religioso, político, ou sei lá o quê, ignorem o motivo porquê estão ali e só estejam ali. O motivo, no final das contas, existindo ou não, não faz mais diferença.

Desculpem o texto meio disconexo e as pitadas de indignação, mas o bagual aqui corcoveia diante de algumas cousas. Pra acabar a história num ar de graça, saibam que as duas horas que passamos lá no rincão da Palavra da Vida, me passei por estudante sueco. Falando só inglês com meu amigo que tinha ido junto. O pessoal nem desconfiou, mesmo tendo uns americanos e alemães por lá. Pessoas muito boas, por sinal. Mas já queriam colocar um versículozinho em sueco no meu bolso...

Abraços brutais!

sexta-feira, 8 de janeiro de 2010

O Mundo Assombrado pelos Demônios - A Ciência vista como uma vela no escuro

Depois de muy bela payada recitada pelo amigo Barradas (que de tão bagual merecia ter mais uns três érres nesse nome), resolvi sair detrás do picumã e mostrar que aquele vivente ali no canto, comendo churrasco gordo e jogando os ossos pro Sabugo Chupado(que vem a ser o cachorro da estância, e que leva o nome por ser feio, mas FEIO. Feio de escorrer uma lágrima), não é mudo.
Pedi o violão e me preparei pra umas coplas buenachas, mas me ocorreu que não sabia o bastante pra me expor assim, que tenho meus brios. Fica prometida a réplica, que nem poderia ter esse nome porque não vou desembainhar a adaga(o que nem seria um problema na estância, que o Ocã já me carneava num vu!).Vou correr uma eguada de artigo, apartar um brioso e apareço por aqui pelo final do mês, pra falar do mesmo assunto.

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Mas como não acho certo vivente que se comporta como moça de família, que esquenta, esquenta mas não prende fogo, vou falar de alguma coisa, pra não parecer um bocaberta completo.E eu vou falar dum xirú macanudo e dumas poesias muy lindas que ele escreveu.O nome do homem é Carl Sagan, ou Carlos Sagaz. Seguido aparece por acá, com umas bombachas largas e favudas, montado no crioulo dele, de nome Cosmos.

Livre-arbítrio? Mas tu tá loco...

"Eu já me enchi desses homens-sim-senhor!
- Vou criar algo que tenha livre-arbítrio!"



Com licença, meus senhores, vai falar um blogueiro!

Serei direto, porque já é tarde e tenho que tirar um cochilo, pelo menos umas duas horinhas! Assunto polêmico nas atualidades, o livre-arbítrio foi posto à prova e, pra surpresa de muitos, melou.

A questão é simples. A resposta, nem tanto.

Temos capacidade de escolha: sim ou não? O que a gente pode falar, sem ter medo, é que temos a sensação de escolher o que fazemos. Mas o que sentimos não é necessariamente real. Por exemplo, quando vocês pegam um rabanete na mão, sentem como se estivessem encostando a pele na raiz, matéria na matéria. Acontece que não é verdade. A distância mínima que um corpo chega do outro é o Raio de Van der Waals, ou seja, não existe contato direto, só o resultado das interações eletrostáticas. Quando o vivente olha pra uma duna, parece que ela é totalmente recheada de areia, mas, na verdade, o que mais tem ali dentro são espaços vazios. Muito bem, adiante.

A experiência não confere sempre com a realidade, mas é importante pra nossa interação com o meio onde vivemos e do qual dependemos. Tendo em vista a importância disso, tá na cara que a seleção natural não ia amolecer pro lado dos que não sentiam nada. Pra demonstrar isso, é só dar uma olhada pros animais. Quase todos (e certamente, todos os mais abundantes) são dotados de órgãos de sentido. Sentem campos elétricos, ondas eletromagnéticas, ondas mecânicas, moléculas e otras cositas más.

A Bíblia diz e todo mundo sabe. Deus deu ao homem a capacidade de escolher o que faz. Acontece que tá se mostrando que não é bem assim, e eu vou explorar essa ideia de um jeito bem banal, que qualquer um é capaz de pensar.

Te imagina com uma decisão difícil: comprar um bagual crioulo ou fazer um puxadinho. O puxadinho tá fazendo falta, pois a patroa tá prenha de novo, e o varãozinho que tá pra nascer vai ser espaçoso que nem o pai. O cavalo é importante pra lida, vai ajudar a fazer uns bicos nos ranchos da região. Agora tu não sabe o que fazer. Vai começar a pensar no passado pra lembrar de histórias parecidas, nas vantagens de ter um cavalo, na história de alguém que ganhou filho recentemente, etc. A outra coisa que tu vai fazer é pensar no futuro, tentando prever o que pode acontecer se tu escolher uma coisa ou a outra. Essa capacidade de pensar no futuro a longo prazo é um diferencial importante dos homens. É difícil bicho que planeje tanto! Bom, vou dar o final da história. Tu vai escolher o puxadinho, porque, há dois anos, a mulher do João das Calhas teve filho, e eles tavam morando numa casinha de um quarto só. Acontece que a dita cuja ganhou o bebê e eles se acomodaram tudo no mesmo quarto. Daí o João anda puto da vida, pois disse que não tem mais intimidade com a patroa, que ela acha que abrir as pernas com o filho por perto é pecado. Imagina só! O cavalo a gente tenta conseguir emprestado, coisa e tal. Mas ficar dois anos ou mais sem uns amassos na querida, não tem como. Isso acaba com qualquer um.

Agora, a análise.

A decisão foi tomada. Aparentemente, o livre-arbítrio existe. É mesmo? Ou tudo o que tu fez foi condicionado por coisas as quais tu já tinha vivenciado? E se tivesse uma oportunidade de emprego boa que dependesse muito de um cavalo, tu ainda ia "escolher" o puxadinho? E se a tua mulher fosse um diabo feio, tua não ia achar bom ter uma trégua no rala-e-rola? Então, meu amigo. Tu agiu deterministicamente, boca-aberta. Pode parecer que tu tinha a capacidade de escolher, mas teu cérebro te lançou pro lado do puxadinho, pois a experiência armazenada que tu tinha dizia que isso era mais importante.

As escolhas tão determinadas por experiências anteriores e pela capacidade de planejamento.

Pra encerrar, que já to me estendendo demais. A sensação de ter tomado uma escolha acontece depois do teu cérebro ter te instruído a seguir um caminho. Não é muito intuitivo, eu sei, mas já tem um estudo provando isso.

Lógico que este artigo não tem a intenção de botar um ponto final na história. É um prelúdio da ópera, tô só iniciando a discussão e, confesso, de uma forma bem grosseira e pouco rigorosa. Tenho certeza que o companheiro Costa (Marcelão, também conhecido como Xiru Motoneta, Xiru Moranguinho e outros) vai se encarregar de escrever algo de melhor qualidade, mas, pra não deixar o blogue parado, vim aqui começar a peleia.

Agora nas férias, a coisa vai ficar meio devagar por aqui. Mas voltando o ritmo maluco do ano, as cousas vão se aprumando e tu vai ver mais conteúdo nessa budega. Já deixo aqui um incentivo ao companheiro Pimentel e ao Costa pra que escrevam. Tu também, que tá lendo aí. Se tiver vontade de escrever algo de acordo com a proposta desse blogue aqui, te esperta, é só falar comigo.

Um abraço do Pablito.