quarta-feira, 20 de abril de 2011

Deriva Ecológica

Texto postado em julho de 2007 no blogue Nucleo Decenio: para la discusión y deleite de la biología evolutiva.
Stephen P. Hubbell

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A ecologia vive hoje um debate muito semelhante ao debate vivido pela genética de populações nas décadas de 60 e 70, quando Kimura propôs que a evolução nucleotídica seguia um padrão neutro (as variações se fixavam aleatoriamente e não direcionada por seleção positiva). Atualmente a ecologia tem aplicado teorias neutras para explicar a estrutura das comunidades, em oposição às teorias que defendem que as comunidades são estruturadas pela competição por nichos. (e.g. Hu et al. 2006; Maurer & McGill 2004).

O principal nome do neutralismo ecológico (eu diria o “Motoo Kimura da ecologia”) é Stephen Hubbell e sua teoria unificada neutra da biodiversidade (TUNB) (Hubbell 2001). Hubbell propõe que a coexistência das espécies deve ser explicada por fatores historicamente contingentes, como, por exemplo, quais espécies chegaram primeiro à comunidade, quantas espécies os recursos de uma determinada área sustentam, etc.

A maior evidência em favor da TUNB são os dados experimentais. Simplesmente, assim como os modelos neutros da genética de populações, os modelos neutros em ecologia funcionam. Ou seja, assim como Kimura mostrou que os modelos nulos de variação se adequavam a taxa de substituição de peptídeos verificada em proteínas como o citocromo c e a hemoglobina, Hubbell verificou que modelos neutros se adequavam à variação observada, principalmente em sua ampla pesquisa com biodiversidade de árvores tropicais.

Os modelos formais da TUNB se caracterizam por considerarem irrelevantes as diferenças entre indivíduos de diferentes espécies que ocupam um mesmo nicho ("fitness invariance"). Hubbell alega que a exclusão competitiva levaria tanto tempo que fenômenos como especiação, dispersão e deriva ecológica a tornaria irrelevante. "Communities are open, nonequilibrium assemblages of species largely thrown together by chance, history, and random dispersal. Species come and go, their presence or absence is dictated by random dispersal and stochastic local extinction" (Hubbell, 2001, p. 8-9).

Por outro lado, Hubbell define as teoria de competição por nicho (TCN) assim: "This view holds that communities are groups of interacting species whose presence or absence and even their relative abundance can be deduced from "assembly rules" that are based on the ecological niches or functional roles of each species (e.g., MacArthur 1970, Levin 1970, Diamond 1975, Weiher and Keddy 1999). According to this view, species coexist in interactive equilibrium with the other species in the community. The stability of the community and its resistance to perturbation derive from the adaptive equilibrium of member species, each of which has evolved to be the best competitor in its own ecological niche" (Hubbell, 2001).

A TCN tem sido retrabalhada para responder a algumas críticas modernas. O principal ponto é que a coexistência de espécies em um mesmo nicho é justificada pela existência de trade-offs. Se duas espécies de um mesmo nicho (no sentido amplo de nicho, talvez melhor definido como guilda) coexistem, elas devem manter trade-offs. Por exemplo, uma espécie deve ser melhor em se esconder e a outra em fugir, de maneira que exista um balanço entre estas propriedades (Chase & Leibold 2003).

Os dois esquemas abaixo representam as duas teorias. A TCN prevê que as comunidades possuem uma estrutura estável que foi historicamente moldada por competição. Se um evento disponibiliza recursos, o equilíbrio é restabelecido. Já a TUNB não espera que a estrutura seja estável, mas dinâmica. Cada vez que recursos são disponibilizados, ocorre uma "deriva ecológica" (expressão de Hubbell) e uma nova estrutura é estabelecida.


Creio que para a maioria dos leitores deste blog não é surpreendente que modelos ecológicos que ignoram a competição por nichos funcionem. Afinal, se a comunidade possui uma estrutura dinâmica e histórica, nada mais razoável que ela derive. No entanto, os modelos neutros tem sofrido certa resistência, principalmente por não se encaixarem em muito dos pressupostos neodarwinistas.

Creio ainda que uma deriva ecológica se tornará cada vez mais plausível à medida que os nichos passarem a ser concebidos como nichos-ontogênicos e não como nichos fenotípicos. Levar a plasticidade fenotípica a sério, ao invés de considerá-la um ruído, minaria muito dos pressupostos da TCN.

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* Hoje (2011), acho que não estamos mais nesse nível de discussão – se fatores estocásticos ou fatores determinísticos são importantes para a estruturação de uma comunidade. A questão central é quanto dessa estruturação é determinada estocástica ou deterministicamente. Os estudos estão focados na quantificação desses fatores. O interessante da TUNB é nos darmos conta do quanto podemos explicar usando apenas modelos neutros, que consideram equivalência entre os indivíduos. Por exemplo, prever a estruturação de uma comunidade em 40% por um modelo neutro me parece muita coisa! Além disso, esse pensamento pode interferir nas práticas de manejo, como mostra o artigo “Niche-assembly vs. dispersal-assembly rules in coastal fish metacommunities: implications for management of biodiversity in brackish lagoons. (Mouillot, 2007)” no Journal of Applied Ecology.

Ainda pretendo escrever mais especificamente sobre as bases da teoria neutra e sua situação hoje, frente aos avanços na quantificação de atributos funcionais.

Abraços


2 comentários:

  1. só pra deixar o pessoal enfezado, o Diamond citado ali é o Jared Diamond...

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