sexta-feira, 16 de abril de 2010

Das Boas Ações

Chegou minha vez! Vou me embretar pelos campos científicos dos companheiros, mas sem muito termo técnico, que também não sou tão metido assim. Lá vai.
A partir de doutrinas filosóficas pós-feudais (a começar pelo Hobbes, passando pelo Adam Smith) começou-se a levantar a questão do egoísmo humano intrínseco a todas as ações, em oposição ao ideal grego de que o homem é naturalmente um animal político (como as abelhas o seriam), razão pela qual sobrepor-se-ia a esfera social à individual. Surge, na modernidade, a ideia do contrato: constituímos o Estado por um acordo de vontades, para que cada um defenda da melhor maneira o próprio interesse (para sair do famigerado Estado de natureza). Outros, os quais creditam algum valor à existência humana, vieram dizendo que não: não é apenas olhando para o próprio umbigo que o homem faz suas escolhas, faz-se, eventualmente, o bem pelo bem; do contrário, qual a explicação para as situações em que o indivíduo nitidamente sacrifica seu interesse em favor do outro? (O resumo foi apertado e, provavelmente, equívoco, mas a ideia é essa).

 Ao que parece, contudo, já se pode afirmar: não há o bem pelo bem. Em um estudo conduzido por Jorge Moll colocaram uns sujeitos numa máquina de ressonância magnética e ficaram monitorando suas atividades cerebrais enquanto postos frente ao seguinte teste: foi dado US$ 120,00 a cada um; então, a pergunta: doar o prêmio a uma entidade carente ou tomá-lo para si? O surpreendente foi o seguinte, em resumo: tanto os que doavam quanto os que ficavam tinham as mesmas áreas do cérebro em atividade, áreas relacionadas ao bem-estar, ao prazer, as quais também são atingidas quando fornicamos, ou usamos drogas, etc. Daí se conclui: os que doavam não o faziam pelo bem do outro, mas pelo próprio! Altruístas não existem; existem, isso sim, egoístas socialmente adequados. E, portanto, pode-se pensar que mesmo o julgamento moral de que o egoísmo é ruim (ou até qualquer julgamento moral) em última análise apenas procura inibir condutas que viriam a lesar os interesses daquele que julga. Trocando em miúdos: quando se diz "isso é ruim", o que na verdade se quer dizer é "isso é ruim para mim".
Alguém dirá: a fome na África não é ruim para mim, e ainda assim me causa tristeza. A isso eu respondo: se te causa tristeza, é sim ruim pra ti, e só por isso (porque te causa algum tipo de mal estar) tens a tenção de eliminar essa situação; por algum motivo (talvez empatia; talvez porque na evolução apenas as espécies que se agruparam conseguiram prosperar; talvez ambos sejam a mesma coisa, realmente não sei) o sofrimento alheio entristece a normalidade das pessoas, e é a nossa própria tristeza que buscamos eliminar com nossas "boas ações".
No fundo, somos todos egoístas. A diferença é que o egoísmo de alguns beneficia os outros. Mas, afinal de contas, faz alguma diferença a motivação subjetiva de cada ato? Se o padeiro faz o pão simplesmente para alimentar ou para ganhar dinheiro, muda alguma coisa? Se o sujeito não trai a a sua prenda porque a ama ou porque tem medo de ser descoberto, por isso a dama vai ser menos/mais feliz?
Mas chega, aqui eu passo a cuia ao próximo.

2 comentários:

  1. Mas sim! Investigando o cerne da questão, chegamos num aparente contrasenso: o altruísmo movido a egoísmo.

    Coisa bonita! Alguns não aceitam isso como verdade, pois acham possa descreditar as boas ações. Assim como Keats disse que Newton "tirou a graça" do arco-íris ao explicá-lo pelo fenômeno da refração. A la putcha!

    Pra mim é bonito ver como um monte egoísta de fuligem com água demonstra comportamentos "altruístas".

    Mas é isso... abraço xulo.

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  2. Na sua obra bem amarrada, "O Gene Egoísta", Dawkins aborda essa cerne da questão. Somos egoístas de maneira inerente.

    Todas as proposições e posturas que assumimos diante das coisas mundanas é no intuito de busca o próprio bem-estar e sucesso; sucesso esse que pode ser reprodutivo, profissional, pessoal, etc.

    O altruísmo é um comportamento selecionado evolutivamente para que possamos maximizar a oportunidade e chance de sucesso. Não há feiúra nisso, muito pelo contrário. É uma função bem engrenada. Fingimos em sociedade sermos altruístas, quando no fundo o que nos move é o sentimento egoísta íntimo. Somos hipócritas, e quem negar, é mais hipócrita ainda!

    Keith Stanovich disse certa vez que: "As únicas pessoas que não são hipócritas são a minúscula e talvez não-existente minoria que é tão santa que nunca se entregam a seus instintos mais básicos e o grupo maior que nunca tenta viver segundo os princípios da moralidade ou virtude."

    Os hipócritas são na verdade a classe mais nobre das pessoas.

    "A hipocrisia é a homenagem que o vício presta à virtude". (François duc de la Rochefoucauld)

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